Ele é um dos maiores luxos do mundo moderno. Aprenda a
identificar como o tempo é desperdiçado no cotidiano e saiba que medidas adotar
para viver melhor, e sem culpa, no trabalho e na vida pessoal.
Revista Istoé - por Eliane Labata
Fazer exercícios físicos é uma das clássicas resoluções de
Ano-Novo. De olho no verão, e após a fartura das festas de Natal e Réveillon, o
mais comum é ouvir (e fazer) promessas de perder as gordurinhas e entrar em
forma para melhorar a saúde e a autoestima. Embora, em tese, a ginástica figure
como prioridade na agenda, costuma ser a primeira atividade cortada na correria
do dia-a-dia. Falta de tempo é a desculpa mais comum. É o cansaço do trabalho,
o resfriado do filho, o encontro com os amigos, tudo vira justificativa para
não suar a camisa.
Tempo é, muitas vezes, uma questão psicológica. É uma opção
que fazemos até inconscientemente. Nem sempre a escassez de horas, algo de que
nos queixamos tanto, é uma questão física. Pode ser uma "realidade
psicológica", termo usado pelo professor Hilário Franco Júnior no livro O
ano 1000, no qual lembra que o tempo não passa na mesma velocidade para todas
as pessoas em todas as circunstâncias. Saber disso, porém, não alivia a
angústia de chegar ao fim do dia, do mês ou do ano e constatar que não deu à
família a atenção que devia, não fez aquele MBA tão importante, não viajou para
a sonhada ilha paradisíaca, não viu os filhos crescerem, etc. Tempo, como disse
o sociólogo italiano Domenico De Masi, é um dos maiores luxos do século XXI. E
há maneiras de usufruir melhor dele.
Autor do livro O ócio criativo, De Masi prega algo que a
consultora de marketing pessoal Maura Cruz Xerfan, do Laboratório de Ideias,
diz estar cada vez mais raro: "O ócio está sendo banido. Falta tempo para
ele", afirma. É hora, portanto, de buscar alternativas e novas maneiras
para viver melhor. Se não for possível tirar férias prolongadas, a consultora
sugere reservar pelo menos 20 minutos, diariamente, para não fazer nada. Mas
cuidado para não gastar esse momento repetindo a constatação da pesquisa
realizada pela consultoria Maris Antropos Consulting, na França: vivemos 75% do
tempo no passado, 25% no futuro e apenas 5% no presente. Um equívoco que joga a
vida fora, de acordo com o escritor indiano Deepak Chopra, o profeta das
medicinas alternativas, como descreveu a revista Time. "O presente é uma
dádiva e por isso se chama presente", defende Chopra. E, se a vida moderna
criou problemas, também inventou soluções. "O audiobook é uma forma de
aproveitar o engarrafamento para escutar o livro que você não tem tempo de
ler", sugere Maura. E arremata com uma dica importantíssima: "É
preciso ter discernimento entre o que é fundamental, essencial, importante,
urgente, e o que pode ser deixado para depois."
Pesquisa do portal Administradores.com.br ouviu, no ano
passado, 2.004 profissionais de todo o País, entre executivos, empreendedores e
acadêmicos, e apenas 20% deles se consideram capazes de ocupar as horas do dia
de forma objetiva. "Já esperávamos esse resultado porque a falta de tempo
é o mal moderno", diz o editor Leandro Vieira, formado em Empreendedorismo
pela Harvard Business School. Dos entrevistados, 36% assumiram não saber
gerenciar o tempo e 45% disseram que conseguem "mais ou menos." Outro
estudo também realizado no ano passado em 12 países pela Proudfoot Consullting
com 1.276 gerentes de nível médio revelou que 34,3% das horas trabalhadas são
improdutivas - o que significa jogar fora 85 dias de labuta por ano. No Brasil,
segundo a pesquisa, quase metade do tempo de trabalho de quem devia estar
comandando e criando é gasto em reuniões infrutíferas, rotina administrativa e
checagem de e-mail.
Saber administrar o dia, porém, é essencial para o
profissional contemporâneo porque isso significa maior produtividade, questão
primordial em qualquer empresa. Para Christian Barbosa, especialista em gerenciamento de tempo, a
solução do problema começa com a adoção de duas medidas: fazer as escolhas de
acordo com as necessidades e planejar com antecedência. "Nunca use a
memória para registrar o que deve ser feito", acrescenta. Há objetos e
máquinas para isso. Segundo ele, essas práticas simples podem levar a pessoa a
ganhar, em média, uma hora por dia.
Usar essa hora a mais
na internet, porém, pode ser um tiro n'água. A escritora americana Jamie Novak
fez levantamentos para seu livro 1000 dicas para administrar melhor sua vida e
constatou que gastamos, em média, 40 minutos por semana - o que significa entre
sete e dez dias por ano - apagando e-mails e spams. É um engolidor de horas que
pode ser evitado. Ela orienta: "Pare de verificar mensagens a toda hora.
Faça isso apenas uma ou duas vezes por dia. E desative o alerta que avisa
quando entra um novo e-mail para evitar a tentação." É aí que reside um
dos problemas do dentista e ator Fábio Cassimiro de Oliveira, 32 anos, paulista
que mora no Rio de Janeiro há uma década. Seu dia começa às 5h da manhã, com
atividade física. O horário comercial é todo no consultório e a noite é
dividida entre tarefas domésticas como supermercado, lazer ou ensaios de peças
teatrais. É no apagar das luzes que ele se enrola, pois tem o hábito de
verificar e-mails e checar seu perfil no Orkut antes de dormir. "É a
perdição. Quando vejo, já é de madrugada. Fico revoltado!", diz ele.
"Por que não fui dormir mais cedo?"
Solteiro, Oliveira diz que tem muita vontade de ter filhos,
mas teme que o aperto aumente porque as obrigações vão se multiplicar. É
verdade. Atender às demandas dos filhos sem complicar a agenda é uma arte. O
empresário Jesse de Andrade, 55 anos, dono do restaurante Josephine, no bairro
Vila Nova Conceição, em São Paulo, mantém um bom esquema com os dois filhos, de
12 e 16 anos, que moram com a mãe. "Se eu tiver que levar um deles ao
médico, saio mais cedo ou chego mais tarde", diz. Há momentos em que os
garotos é que flexibilizam o horário. "Às vezes, eles ligam e falam: 'Pai,
vamos almoçar juntos?' Respondo que sim, mas que terão que esperar até o
movimento do restaurante baixar, por volta das 15h." Outra boa providência
de Andrade é morar bem perto de tudo: do shopping, do cinema, do clube e,
principalmente, do trabalho. "Da janela de casa, vejo o movimento no restaurante.
Não perco tempo em trânsito." Ele não sabe, mas essa é uma opção verde das
mais modernas. De acordo com o ecologista e deputado federal Ferrnando Gabeira
(PV-RJ), é a tendênncia atual de grandes centros urbanos da Europa.
"Resolver tudo no próprio bairro ou bem perto. Economiza tempo e
combustível, polui menos e colabora com a sustentabilidade da cidade",
diz.
As escolhas que determinam o aperto de tempo são culturais,
fruto da hierarquização de valores, segundo Patrícia Tomei, professora e
consultora da área de administração e comportamento organizacional da
Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro. É a história da
ginástica citada no início desta reportagem. É difícil pensar em alguém, hoje,
mais ocupado do que Barack Obama, o novo presidente dos Estados Unidos. Mas ele
prioriza este compromisso e, por isso, sempre encontra espaço na agenda para os
exercícios físicos. "Se estar com a família for um valor para determinada
pessoa, ela conseguirá", diz a consultora. "Toda escolha tem seu
preço. Não é possível ficar só com a parte boa, viver só com o melhor dos
lados. O problema é que as pessoas têm dificuldade em identificar o que é mais
relevante."
Na opinião da escritora Rosiska Darcy de Oliveira, autora de
Reengenharia do tempo, é preciso dar ao tema tempo a mesma importância que,
atualmente, damos à natureza. "Está insustentável", diz ela, para
quem os prejuízos emocional e físico fazem com que o problema não seja mais
individual e sim uma questão social - muita gente fica doente devido ao stress
e angústia gerada pela impotência entre o muito a fazer e as 24 horas de um
dia. "Setores de recursos humanos das empresas já sabem, hoje, que pessoas
estressadas por excesso de trabalho são menos produtivas", afirma. Por
isso, trabalhar em casa já é visto, segundo Rosiska, como benéfico para
empregadores e empregados, pois há economia de tempo nos engarrafamentos e
ganho de convivência familiar. A situação feminina, entretanto, continua sendo
dramática, como afirma a pesquisadora: "Mulher não tem tempo livre. Quando
tem, aproveita para fazer alguma coisa em casa" - como resolver problemas
domésticos, levar um familiar no médico, dar atenção aos filhos.
A arquiteta mineira Fabiana Gonçalves, 31 anos, diz estar
cansada da correria e reclama do excesso de tarefas. Casada, ela costuma
trabalhar nos fins de semana por força da profissão, visitando obras em bairros
distantes do Rio, onde mora. Ela faz psicanálise duas vezes por semana e no
tempo livre aproveita para correr na praia, ir à igreja, estudar inglês, fazer
musculação. "Fico desesperada. Tem dia que não consigo cumprir a metade do
que tenho que fazer", conta. Mas ela sabe que tudo é uma questão de organização
e pretende rever sua rotina para 2009. "Sei que está vazando tempo em
coisas que posso alterar. Se eu cuidar melhor da agenda, isso pode mudar."
O mesmo relógio que tortura Fabiana também tiraniza milhões
de pessoas pelo mundo. "A produção industrial, do fim do século XIX até
hoje, transformou a vida em uma grande linha de montagem", diz o
psiquiatra italiano Willy Pasini, autor de Os tempos do coração. Pasini aponta
uma porta de saída para este mal do mundo moderno: aderir ao movimento União
para Redução da Velocidade do Tempo, criado em Berlim, na Alemanha. O movimento
aconselha as pessoas a renunciar ao relógio pelo menos uma vez por semana. Só
para deixar bem claro quem é que manda em quem.

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